Família de menino negro que teve foto usada em tatuagem pede indenização por danos morais a tatuador e organização de evento

Tatuagem feita com imagem de criança de 4 anos sem autorização dos pais e fotógrafo — Foto: Reprodução/Instagram 1 de 3 Tatuagem feita com imagem de criança de 4 anos sem autorização dos pais e fotógrafo — Foto: Reprodução/Instagram

Tatuagem feita com imagem de criança de 4 anos sem autorização dos pais e fotógrafo — Foto: Reprodução/Instagram

A família do menino negro que teve a foto do rosto usada sem autorização pelo tatuador Neto Coutinho durante a convenção de tatuagem "Tatto Week", em São Paulo, entrou com uma ação na quarta-feira (18) por danos morais contra Coutinho e também contra a organização do evento.

O caso ocorreu em outubro do ano passado e ganhou repercussão depois que a mãe da criança, Daniele de Oliveira Cantanhede, mais conhecida como Preta Lagbara, denunciou que a imagem não havia sido autorizada pelos pais nem pelo fotógrafo autor do registro.

Moradora do Rio de Janeiro, ela contou ao 💥️g1, na época, que soube por internautas que o rosto do filho havia sido tatuado em uma pessoa desconhecida da capital paulista. Uma ação, então, foi ajuizada em dezembro de 2022 para que a identidade da pessoa tatuada fosse revelada.

Agora, outra ação foi ajuizada pela defesa da família para pedir indenização tanto para o tatuador quanto para a organização do Tatto Week. O valor pedido não foi divulgado.

"Eu e a advogada Letícia Domingos queremos esclarecer que, após inúmeras tentativas de resolução amigável tatuador, não foi possível chegar a um acordo, pois o tatuador Neto Coutinho dispensou o antigo advogado, deixando claro que todas as tratativas não tinham validade jurídica. A partir dali, encerramos o diálogo passando tudo a ser resolvido por meio da Justiça. Temos plena convicção que venceremos essa demanda, pois se trata de uma luta travada pela Preta Lagbara que conta com o apoio de toda a população brasileira", disse.

"A outra ação para identificar quem seria a pessoa ainda está na Justiça, mas pode ser que o objeto caia porque a imagem começou a ser coberta, conforme nos foi informado", ressaltou.

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Em nota, o advogado da Tattoo Week, Helder Galvão, disse que ainda não recebeu nenhum tipo de citação.

"Lamento a falta de diálogo e sucessivos discursos de ódio e incitação à violência que a senhora Daniele de Oliveira Castanhede vem semeando contra os tatuadores. Estamos amparados pela lei brasileira e não mediremos esforços pelo respeito a todos e as boas práticas. Inclusive lançaremos um guia para orientar os tatuadores para exercerem a sua profissão sem temer esse tipo de censura", afirmou.

O 💥️g1 não conseguiu contato com o novo advogado de Neto Coutinho.

No dia 23 de dezembro, Neto Coutinho publicou no seu perfil do Instagram que o início da cobertura da tatuagem teve início em 16 de dezembro e que apagou o rosto da criança.

"Como eu havia me comprometido ratifico que as medidas necessárias para atender a solicitação da Preta Alagbara, mãe da criança, no sentido de providenciar a cobertura daquela imagem na pele da pessoa que serviu de tela durante a convenção, foram adotadas por mim por mera liberdade e sem assunção de responsabilidade."

"Tão logo o processo natural de cicatrização da tatuagem foi concluído, a cobertura da tatuagem teve início por meio de longa sessão, ocorrida no dia 16 de dezembro, que, ao final, já possibilitou que a imagem da criança fosse coberta por nova tatuagem."

Segundo ele, será realizada mais uma sessão, após o novo processo natural de cicatrização da pele, "para a conclusão da nova arte, agendada para o dia 29 de janeiro de 2023".

Conforme disse o advogado de Preta, Djeff Amadeus, ainda não foram enviados nem foto nem vídeo que comprovem que a tatuagem com o rosto da criança começou realmente a ser coberta.

"Vamos esperar até o dia 29 de janeiro, que é a data estipulada pelo tatuador para fazer a última sessão de cobertura. Vamos ver se enviarão alguma comprovação para a gente. Até tínhamos pedido para que a Preta acompanhasse a cobertura", afirmou Amadeus.

A denúncia foi feita nas redes sociais pela mãe do menino, que mora na Zona Norte do Rio.

O tatuador Neto Coutinho pediu desculpas para a família e quer resolver a situação de forma pacífica, segundo seu advogado de defesa na época, Gabriel Rodrigues 💥. A mãe da criança autorizou o 💥️g1 a incluir a imagem do rosto do filho na reportagem.

Foto do filho de Preta Lagbara tirada pelo fotógrafo Ronald Santos Cruz — Foto: Ronald Santos Cruz 2 de 3 Foto do filho de Preta Lagbara tirada pelo fotógrafo Ronald Santos Cruz — Foto: Ronald Santos Cruz

Foto do filho de Preta Lagbara tirada pelo fotógrafo Ronald Santos Cruz — Foto: Ronald Santos Cruz

De acordo com a organização que premiou a tatuagem, o critério da premiação foi "estritamente técnico e artístico, julgado por uma comissão de conceituados tatuadores". Não houve entrega de dinheiro.

Ao 💥️g1, Preta Lagbara disse que, no fim do mês passado, um internauta marcou-a na postagem do tatuador que tinha publicado a foto com o menino e comemorava o segundo lugar na premiação.

Foi então que Preta pediu ajuda para o fotógrafo Ronald Santos Cruz, que foi quem fez a imagem do filho com a autorização dela, neste ano.

Ronald tem mais de 80 mil seguidores nas redes sociais e é conhecido por retratar pessoas negras no Brasil. Em 2023, ele chegou a ser selecionado para a exposição de fotografia pelo Centro Europeu e, em 2023, ficou entre os 100 melhores fotógrafos do mundo na modalidade retrato masculino, pelo Concurso Internacional realizado pela empresa russa 35awards.

"Eu pedi ajuda para ele compartilhar o caso, porque estava sem resposta. Ele compartilhou, achou um absurdo também, e aí repercutiu muito. Com a repercussão, o tatuador veio me procurar falando que achou a foto no Pinterest [rede social de compartilhamento de fotos], achou bonita e tatuou durante o evento", disse.

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Fotógrafo e mãe da criança denunciaram uso da imagem sem autorização nas redes sociais — Foto: Reprodução/Instagram 3 de 3 Fotógrafo e mãe da criança denunciaram uso da imagem sem autorização nas redes sociais — Foto: Reprodução/Instagram

Fotógrafo e mãe da criança denunciaram uso da imagem sem autorização nas redes sociais — Foto: Reprodução/Instagram

Em seu perfil no Instagram, o fotógrafo Ronald ressaltou que não foi consultado pelo tatuador sobre o uso de sua foto.

"Como um cara branco deixa um tatuador tatuar uma imagem de uma criança negra que nunca viu na sua vida em seu corpo? Eu sou um cara que sempre fotografo muitas crianças e, uma hora ou outra, sempre chega um artista que pergunta se pode usar meu trabalho como referência. Eu sempre digo que vou ver com os pais quando não tem fins lucrativos. Mas essa tatuagem foi tão perversa, sem explicação", disse.

"Segundo o tatuador, ele achou a foto no Pinterest e achou que fosse pública, e resolveu tatuar a criança num corpo branco. A gente está em 2022 e, se voltarmos lá atrás, vemos que muita coisa não mudou. Como se nossos corpos, nossos rostos, não tivessem donos. E olhar o caso como esse é do mínimo absurdo. Primeiro, tem os direitos autorais de pegar a foto. Segundo, é a imagem de uma criança. Terceiro, participa de um prêmio com a foto de uma criança que achou bonito e vai lá tatua. É sem lógica."

Ainda conforme Ronald, ele está com apoio jurídico e vendo a melhor opção para tratar do caso. "No mínimo curioso porque é sem noção. Caso inédito de ter foto virar tatuagem sem permissão."

No ano passado, o 💥️g1 conversou com o advogado que fazia a defesa do tatuador, Gabriel Rodrigues, que disse que o tatuador não teve má-fé e pediu desculpas para a família.

Em nota publicada em sua rede social, o tatuador também se retratou com a comunidade preta. 💥️Veja a nota na íntegra.

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