Empresa aceita absorver prejuízo e seguir plano de festa para alunos de medicina da USP que levaram golpe de colega, diz Procon
A empresa ÁS Formaturas se reuniu com o Procon-SP nesta segunda-feira (23) e prometeu não repassar aos alunos o prejuízo de R$ 927 mil que teve com o desvio do dinheiro do evento por Alicia Dudy Muller Veiga, de 25 anos, presidente da comissão de formatura de medicina da Universidade de São Paulo (USP). A empresa também concordou em bancar com fornecedores a mesma estrutura da festa que havia sido contratada.
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Guilherme Farid, chefe de gabinete Procon-SP, disse em entrevista coletiva que o contrato entre as partes foi fechado em 2023. No entanto, a pessoa jurídica que formalizou a negociação, que seria uma associação dos formandos, nunca foi registrada.
“O contrato foi celebrado entre duas pessoas jurídicas. Mas os alunos teriam que ter criado uma associação, registrado no tabelião de notas e formado pessoa jurídica. Teria representatividade legal", disse.
Segundo ele, o negócio foi "mal elaborado" e fechado informalmente. A empresa tem 15 dias para entrar em contato de forma individual com os cerca de 130 alunos envolvidos e apresentar a proposta. A ÁS já havia feito a celebração da turma anterior, a 105ª.
Das mais de 100 pessoas interessadas no evento, quem deliberava sobre os valores era um grupo formado por cerca de 20 pessoas, e as comunicações eram feitas via WhatsApp.
No caso de os alunos aceitarem o plano, que deve se desenrolar em um ano até a realização, o Procon-SP irá acompanhar o caso. Se forem comprovados ao fim de todo o processo problemas relacionados com a empresa, uma multa de até R$ 12 milhões pode ser aplicada.
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No domingo, os estudantes resolveram montar um meio para captar doações online. Segundo o anúncio feito por eles nas redes sociais, os primeiros doadores de valores a partir de R$ 1.500 vão ter direito a um convite.
A publicação traz incentivos assim em propostas de até R$ 9 mil, a qual tem direito a três ingressos e a uma mesa.
"Foram após muitos pedidos como esse que estamos aqui então, de coração aberto, tentando novamente fazer uma arrecadação, mesmo que pequena para, quem sabe, voltar a pensar na formatura como algo possível de ser feito."
"O dinheiro arrecadado foi pago em parcelas ao longo de 4 anos e muitos colegas nossos e seus familiares se sacrificaram pela realização de ter uma festa de formatura. Fomos a primeira turma a incluir a adesão social para aqueles que tinham esse sonho mas não conseguiam encarar o valor integral", escreveu.
Nos comentários, a página da comissão pede ajuda a artistas.
Anteriormente, a USP, ao ser questionada sobre a situação da estudante de medicina Alicia, investigada por dar um golpe em colegas da faculdade e em uma lotérica, informou que "está acompanhando a apuração dos fatos".
A TV Globo perguntou se a universidade considera expulsar Alícia do curso após os ocorridos, se ela poderá colar grau normalmente e, também, qual o posicionamento da entidade sobre o caso, mas não recebeu respostas específicas.
"Diante do andamento da investigação sobre a fraude contra a Comissão de Formatura, que envolve uma aluna da Faculdade de Medicina da USP, a Instituição informa que está acompanhando a apuração dos fatos pelos órgãos competentes."
Alicia foi ouvida na tarde da quinta-feira (19) em São Paulo. Ela confirmou à polícia que desviou os valores que seriam usados para a festa de formatura por entender que os recursos não estavam sendo bem administrados pela empresa contratada, mas fez "aplicações ruins" e acabou perdendo dinheiro.
No "desespero", ela diz que tentou recuperar o montante fazendo apostas em uma lotérica. Ela também admitiu que usou em benefício próprio uma parte das quantias para pagar despesas pessoais como aluguel de carro, apartamento e compra de eletrônicos. A estudante afirma ter agido sozinha, mas a namorada dela também será ouvida.
Segundo a Polícia Civil, Alicia vai ser indiciada por apropriação indébita, crime que tem previsão de pena de até quatro anos de reclusão, e vai responder em liberdade.
De acordo com o interrogatório, Alicia tem renda mensal de cerca de R$ 4.500. Ela assumiu à polícia que a história que contou aos colegas da comissão de que teria investido o dinheiro da formatura em um fundo e sofrido um golpe era mentira.
Também de acordo com a polícia, a empresa ÁS Formaturas confirmou que transferiu quase R$ 1 milhão para a conta bancária da estudante, que era presidente da comissão de formatura da turma 106 da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
A polícia disse também que, de acordo com os documentos apresentados pela ÁS, não há responsabilidade jurídica por parte da empresa.
"O contrato autorizava eles a fazerem essas transferências para os membros da formatura, para qualquer um dos representantes da comissão", explicou a delegada.
O 💥️g1 levantou que Alicia recebeu de R$ 3.000 de Auxílio Emergencial do governo federal. A policial explicou a situação da família da estudante.
"Os nossos investigadores tiveram contato com a família. Trata-se de família humilde mesmo. Ela conseguiu ingressar no curso com muito esforço, a origem é humilde", disse.
1 de 3 Alicia Dudy Müller Veiga é acusada de golpe na USP — Foto: ReproduçãoAlicia Dudy Müller Veiga é acusada de golpe na USP — Foto: Reprodução
"Inclusive, o valor pago por cada estudante para empresa na formatura era de R$ 12 mil. Os estudantes que comprovassem uma situação financeira econômica um pouco mais difícil pagariam R$ 6 mil. Ela Foi agraciada com essa possibilidade", completou.
Natural do interior de São Paulo, Alicia Dudy Muller ingressou na faculdade de Medicina em 2018. Ela está no sexto ano do curso.
Alicia nasceu em Itararé, mas reside em um prédio na Vila Mariana, na Zona Sul da capital. Na plataforma Currículo Lattes, que reúne dados sobre estudantes e pesquisadores, ela informou ter feito o ensino médio na Escola Técnica Estadual Getúlio Vargas, na região do Ipiranga.
Em entrevista para a Rádio USP em fevereiro de 2018, ela afirmou que tinha passado no curso de Farmácia e até chegou a fazer a matrícula, mas desistiu e decidiu fazer cursinho por mais um ano para tentar entrar em Medicina.
A jovem é alvo de dois inquéritos policiais. São eles:
A polícia já acreditava que o dinheiro usado pela estudante em apostas não pagas feitas no ano passado na lotérica da Zona Sul de São Paulo poderia ter sido desviado da festa de formatura de Medicina da Universidade de São Paulo(USP).
Os dados de transações bancárias foram analisados com a quebra do sigilo.
Em um vídeo gravado há quatro anos para o cursinho em que estudou, Alicia comentou sobre o processo de aprovação na Faculdade de Medicina da USP. O registro foi publicado em 14 de maio de 2018.
Segundo o boletim de ocorrência sobre o caso do sumiço do dinheiro registrado por dois alunos, Alicia solicitou à empresa ÁS Formaturas — que seria responsável pela organização da festa — a transferência de R$ 927 mil em três parcelas:
Em nota, a ÁS negou ser a responsável pela organização da festa, como citado no boletim de ocorrência, e disse que "não se comprometeu com a realização ou produção de qualquer evento".
"A responsabilidade da ÁS no contrato limitava-se a arrecadar os valores dos formandos e transferir para a turma, além da realização da cobertura fotográfica", diz a nota.
Antes, Alicia afirmou ter aplicado R$ 800 mil em uma corretora de investimentos chamada Sentinel Bank, que é investigada pela Polícia Federal (PF) por suspeita de fazer parte de um golpe de falso investimento na Bolsa de Valores. Ela, no entanto, não teria apresentado comprovantes sobre a movimentação.
Segundo as investigações, o grupo prometia investimentos com lucro acima do mercado. Apesar disso, os valores entregues pelas vítimas não eram totalmente aplicados e resultavam em prejuízos.
O 💥️g1 tentou contato com Alicia, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Em mensagem no grupo de WhatsApp da comissão organizadora, Alicia disse que aplicou o dinheiro em uma investidora e teria sido vítima de um golpe.
Na mensagem, ela afirma que usou parte do valor para pagar advogados por conta do suposto golpe. A estudante diz ainda que vai pedir ajuda da direção para pagar a festa. O caso é investigado pela polícia e pela direção da universidade.
"Escrevo para dizer que não temos dinheiro. Com toda dor, culpa e arrependimento que vocês podem imaginar. (...) Nosso dinheiro foi todo repassado para a Sentinel Bank, uma investidora que, no fim das contas, não se passava de um grande golpe e nunca mais retornou nem com o dinheiro investido, nem com os rendimentos."
E ela prossegue: "Vou ver com a diretoria da FMUSP se conseguimos ajuda deles".
Um print com a mensagem viralizou nas redes sociais, após repercussão do caso.
2 de 3 Print do relato da estudante, suspeita de desviar quase R$ 1 milhão de fundo de formatura da USP — Foto: Reprodução/Redes SociaisPrint do relato da estudante, suspeita de desviar quase R$ 1 milhão de fundo de formatura da USP — Foto: Reprodução/Redes Sociais
Em entrevista ao💥️ g1, estudantes que pagaram a formatura relataram que estão se sentindo impotentes.
Uma das vítimas disse que os alunos estão sendo muito expostos e preferiu não se identificar. Ela contou que a suspeita "parecia ter uma vida normal, ser uma pessoa normal".
"Foi uma surpresa ruim que coloca muitas inseguranças em relação à realização do evento. A gente está falando tanto de um valor alto individualmente — porque, apesar de ser parcelado, todo mundo pagou em torno de R$ 300 por mês", contou.
3 de 3 Faculdade de Medicina da USP — Foto: Divulgação/FMUSPFaculdade de Medicina da USP — Foto: Divulgação/FMUSP
"De toda a história contada pela [suspeita], o único fato que temos certeza é a transferência do montante guardado sob custódia da empresa ÁS Formaturas para uma conta pessoal dela. Ainda estamos averiguando em que contexto foram realizadas as transferências", disseram em nota os membros da comissão.
A ÁS Formaturas disse que "todas as transferências foram realizadas rigorosamente conforme estabelecido nas cláusulas contratuais" e que estão à disposição das autoridades para o fornecimento de documentos.
O 💥️g1 procurou a Sentinel Bank, mas não obteve resposta até a última atualização desta reportagem.
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