Anos após morte de irmã Dorothy, ativistas ainda sofrem ameaças na Amazônia sem lei
Em Anapu, o governo federal encerrou em agosto um contrato com uma empresa local que foi firmado para oferecer proteção aos moradores (Imagem: REUTERS/Nacho Doce)
Catorze anos atrás, em uma estrada de terra de um assentamento remoto no norte do Brasil, um matador pago por pecuaristas locais executou uma freira norte-americana que havia passado grande parte da vida lutando para salvar a floresta tropical da Amazônia e defendendo os pobres do campo.
O assassinato de Dorothy Stang, de 73 anos, que foi baleada seis vezes no peito, nas costas e na cabeça, chocou o mundo em 2005.
Seus ex-colegas, que ainda moram perto da cidade de Anapu, no Pará, onde ela trabalhava, dizem que a área continua tão à margem da lei e perigosa quanto antes.
“É um povo que quer manter a floresta em pé e defende essa floresta, até mesmo com a vida”, disse a irmã Jane Dwyer, segurando uma foto da colega morta. “Porque tem gente foragida de pistoleiros e ameaças, por que eles insistem que a floresta tem que ficar em pé e defendem.”
Sua situação ressalta o problema de se policiar a vasta Amazônia, onde neste ano madeireiros, pecuaristas e agricultores têm sido acusados de provocar um aumento acentuado nos incêndios e no desmatamento.
Jane e outras freiras contaram 18 mortes de agricultores de subsistência na região desde 2015. Elas dizem que os agricultores foram assassinados devido a disputas de terras e que ao menos 40 pessoas deixaram a área depois de receberem ameaças.
A Procuradoria-Geral do Estado do Pará não respondeu de imediato a um pedido de comentário sobre as alegações.
Os incêndios na Amazônia geraram uma grande crise para o presidente Jair Bolsonaro, que reagiu com irritação às acusações globais de que não está fazendo o suficiente para proteger um dos maiores escudos naturais contra a mudança climática.
Críticos disseram que sua eleição encorajou seus apoiadores armados a ignorarem as regulações ambientais. Ele nega isso, mas tomou posse em janeiro prometendo levar progresso à Amazônia, e há tempos critica as reservas indígenas e as multas ambientais por vê-las como entraves ao desenvolvimento.
Bolsonaro também é um cético de longa data de organizações não-governamentais, inclusive a Igreja Católica, que atuam na Amazônia, argumentando que estão tentando limitar a soberania brasileira. Quando a notícia dos incêndios florestais veio à tona, ele chegou a levantar suspeitas de que ONGs estariam por trás disso, sem apresentar provas.
Sua abordagem provocou tensões com líderes globais, entre eles o papa Francisco. O primeiro pontífice latino-americano disse neste mês que o desmatamento veloz não deveria ser tratado como uma questão local, já que ameaça o futuro do planeta.
No mês que vem, o Vaticano sediará um sínodo de bispos e outros representantes, incluindo povos indígenas de toda a América do Sul. A questão da proteção da Amazônia provavelmente terá grande destaque.
“Estamos assustados”
Nas profundezas da floresta tropical, e longe dos corredores do poder, proteger a Amazônia é uma tarefa solitária, desafiadora e cada vez mais perigosa, dizem os que estão na linha de frente da luta.
Em Anapu, o governo federal encerrou em agosto um contrato com uma empresa local que foi firmado para oferecer proteção aos moradores e à floresta circundante contra invasores, disseram habitantes, que foram informados que o contrato não foi renovado por causa da falta de financiamento. A empresa de segurança encaminhou a reportagem ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária e o Incra não respondeu a um pedido de comentário da Reuters.
Vinicius da Silva, de 37 anos, que comanda uma sociedade de conservação ambiental em uma reserva local e disse ter recebido ameaças de madeireiros, reclamou da falta de apoio.
“Não temos proteção”, disse. “Estamos assustados. Não sabemos mais quem entra e quem sai, o que irá fazer, às vezes só sabemos que estão fazendo coisa errada, e quando pedimos ajuda do governo, eles vêm pra fiscalizar e ver os danos ambientais, mesmo assim eles dizem que quem desmatou foi o pessoal da associação, nós acabamos ficando com medo.”
O Ministério do Meio Ambiente não respondeu de imediato a um pedido de comentário.
Bolsonaro disse que o Brasil, que enfrenta limitações orçamentárias severas após anos de recessão, não tem recursos para policiar a vastidão amazônica.
Mas o padre Amaro Lopes de Souza, que assim como Dorothy Stang luta pelos direitos dos sem-terra e pela preservação ambiental na região, disse que o presidente não fez o bastante para proteger o povo ou a floresta.
“Quem destrói a Amazônia não é o pequeno produtor, é o grande latifúndio. Esse latifúndio que colocou ele na Presidência agora achou que deveria desmatar e queimar e devorar tudo”, disse.
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