Rodolfo Amstalden: amasse e jogue na lixeira
“Eu não recomendaria a nenhum dos meus amigos ou familiares ter menos de 30% em Bolsa”, diz o colunista (Imagem: Unsplash/@austindistel)
Eu não gosto de julgar o que os outros fazem. Prefiro focar naquilo que nós fazemos, pelo bem de nossos assinantes. Há uma dotação limitada de tempo e espaço na vida, de modo que devemos alocar o nosso próprio foco com muito foco.
De fato, quanto mais envelheço, mais suspendo o julgamento de hábitos alheios; essa é uma das grandes vantagens que escolhi para envelhecer.
“Você viu que sujeito gestor arrogante está perdendo tantos por cento nos últimos 12 meses?”
Não vi, porque estava trabalhando. Não me interesso. Espero que ele se recupere, para alegria geral da nação.
No entanto, quando meus leitores enviam fotos de feridas baseadas naquilo que os outros fazem, a coisa muda de figura. Ocorre um processo de internalização por meio do qual a questão do outro passa a ser uma questão minha.
Por exemplo: um leitor pegou este gráfico abaixo de matéria da Folha e me mandou perguntando: “Sou assim, assim e assim, tenho tanto de patrimônio, em qual categoria me encontro?”.
Ficou difícil de responder sem querer amassar o gráfico e jogar na lixeira.
Não faz sentido colocar fundos multimercados em paralelo com renda fixa e renda variável, já que esses fundos tipicamente carregam ativos de renda fixa e de renda variável.
Ao considerar os multimercados como uma aplicação à parte, não conseguimos enxergar precisamente nossas alocações conforme cada classe de ativos.
Além disso, existem nuances gritantes entre alocações de multimercados diferentes. Os 30% ou 40% de peso atribuídos a eles podem significar qualquer coisa.
Nesse sentido, a depender do fundo escolhido, o conservador da figura pode ser extremamente agressivo, enquanto o agressivo está agindo como conservador.
A verdade é que esses perfis de investidor são uma merda, rótulos herméticos sem qualquer aderência com comportamentos ou objetivos reais.
No contexto atual, eu não recomendaria a nenhum dos meus amigos ou familiares ter menos de 30% em Bolsa, nem carregaria 60% em renda fixa, sob hipótese alguma.
Conservador, na figura, é o que está desatualizado em seus investimentos.
Agressivo é o que não sabe direito o que tem, ou não sabe o que quer.
Os demais — Moderado e Arrojado — são combinações dos dois extremos.
As pessoas olham para esses gráficos, passam a acreditar neles, tentam encaixar suas existências complexas em camas de Procusto simplistas.
Esses gráficos são perigosos.
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