Brasileiros abandonam o país de Bolsonaro e “fuga” cresce 35% na última década
Mais de 56.000 brasileiros foram encontrados na fronteira sul dos EUA no último ano fiscal, comparado a apenas 1.500 apreensões no ano fiscal de 2018 (Imagem: Marcelo Camargo/ Agência Brasil)
Como brasileiro que emigrou para os 💥️EUA, muitas vezes me perguntam se eu ainda tenho família no País. Desde que viemos para os EUA, em 1999, voltávamos todo verão e nos alternávamos entre a casa da vovó Mercedes e os apartamentos das minhas quatro tias no Rio de Janeiro.
Hoje em dia, quase não temos parentes para visitar.
Meu tio foi o primeiro a partir e hoje trabalha como cardiologista na Flórida. Nós seguimos seus passos alguns anos depois e fomos viver em Miami. Em seguida, outros integrantes da família — médicos, engenheiros e advogados formados no Brasil — foram se mudando para 💥️Israel. Em uma geração, mais de 30 membros de uma família deixaram o País.
A piada famosa é que o Brasil é o país do futuro — e sempre será. Por mais grosseiro que pareça, cada vez mais brasileiros compartilham esse sentimento e, apesar de seu amor pelo País, decidiram se mudar para o exterior.
O número de brasileiros vivendo no exterior aumentou 35% na última década. Nos EUA, foram 3,4 milhões de pedidos de visto para empregos de alta qualificação — em engenharia de software, finanças e outras áreas. Além dos EUA, é grande a procura por destinos como 💥️Portugal, 💥️Reino Unido e 💥️Japão, segundo um estudo publicado no ano passado pelo 💥️Ministério das Relações Exteriores.
Com a inflação e o desemprego em alta em meio à pandemia, brasileiros que não conseguiram visto rumaram para o norte mesmo sem documentação. Mais de 56.000 brasileiros foram encontrados na fronteira sul dos EUA no último ano fiscal, comparado a apenas 1.500 apreensões no ano fiscal de 2018, pouco antes de o presidente 💥️Jair Bolsonaro tomar posse. Uma pequena cidade em 💥️Minas Gerais, Alpercata, por exemplo, está se esvaziando rapidamente à medida que as famílias vendem seus pertences para bancar a viagem ilegal para os EUA.
A instabilidade política e econômica incentiva a migração não apenas no Brasil, mas em grande parte da América Latina. Períodos de alta dos preços das 💥️commodities impulsionam ondas de crescimento econômico e, por algum tempo, as economias parecem estar em recuperação. Mas mudanças políticas bruscas e choques externos — como a queda na demanda global por soja, carne bovina ou petróleo — atrapalham o crescimento e a debandada se acelera.
Resumidamente, o Brasil precisa deixar de ser o pasto do mundo (o que contribui para a destruição da 💥️Amazônia) e se tornar uma economia impulsionada por inovação.
As políticas de Bolsonaro tiveram um efeito assustador nas perspectivas dos pesquisadores, diz economista (Imagem: REUTERS/Adriano Machado)
Infelizmente, à medida que a polarização se agravou, também piorou o debate sobre o financiamento à educação e à ciência. Bolsonaro alertou que vacinas contra a 💥️Covid poderiam transformar as pessoas em jacarés, incentiva o ceticismo em relação ao ensino superior e promete consertar o sistema educacional “marxista” que ele vê no Brasil.
O economista João Leal, formado pela London School of Economics e autor de estudo sobre a “fuga de cérebros” do Brasil, argumenta que as políticas de Bolsonaro tiveram um efeito assustador nas perspectivas dos pesquisadores e, mais amplamente, da classe média-alta brasileira.
Antes da pandemia, Bolsonaro já lutava contra servidores públicos em cargos científicos que não compartilhavam sua ideologia política. Ele demitiu o diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais por publicar dados de satélite que mostraram aumento acentuado do desmatamento. A guerra contra a ciência se intensificou após a pandemia, com dois ministros da Saúde destituídos por defenderem medidas como o distanciamento social.
No meio acadêmico, Leal diz que mais preocupante foi o corte de milhares de bolsas para pesquisas de mestrado e doutorado e a retirada de recursos das universidades, o que quase provocou a falência da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
O ex-presidente 💥️Luiz Inácio Lula da Silva, favorito a vencer a eleição presidencial de outubro, prometeu restabelecer o financiamento para que, nas palavras dele, o filho de um operário possa se formar em medicina. No entanto, Lula não está prestando atenção suficiente a outros problemas do Brasil: controle excessivo do Estado sobre a economia e um setor privado moribundo.
Lula não revelou suas intenções sobre a tão necessária reforma tributária (Imagem: Reuters/Carla Carniel)
Embora tenha animado os mercados ao dizer que gostaria de ter o centrista 💥️Geraldo Alckmin em sua chapa, o ex-presidente critica a atitude favorável de Bolsonaro em relação às empresas. Lula não revelou suas intenções sobre a tão necessária 💥️reforma tributária. Além de investimentos em educação, destravar o crescimento econômico exige reformas estruturais.
O Brasil não é o líder da região quando se trata de emigração. A saída de brasileiros foi compensada em parte por um quarto de milhão de venezuelanos que buscaram refúgio do outro lado da fronteira nos últimos anos. Mas a crise econômica no Brasil afetou severamente o mercado de trabalho para pessoas com curso superior. A parcela de profissionais qualificados que estão desempregados ou atuando em ocupações precárias é muito maior do que a média nacional, segundo Leal.
A partida de cidadãos mais qualificados significa que o Brasil continuará atrás do resto do mundo em se tratando de um dos principais fatores preditivos do crescimento econômico: produtividade. Sem melhora da produtividade, a economia brasileira — que está tecnicamente em recessão — terá potencial de crescimento limitado, segundo Adriana Dupita, economista da Bloomberg.
Em geral, meus primos se casaram com outros expatriados brasileiros e criam seus filhos na cultura brasileira mesmo vivendo no exterior. Eles ainda fazem churrasco com os amigos, falam português com os filhos, torcem pela Seleção e escutam MPB.
O sentimento de nostalgia deles pelo Rio de Janeiro me lembra o trecho de uma canção de João Gilberto: “Eu vim da Bahia, mas algum dia eu volto pra lá.”
O compositor morreu no Rio sem ter voltado a morar em seu empobrecido estado natal. E eu desconfio que a maioria da minha família não voltará a viver no Brasil.
O que você está lendo é [Brasileiros abandonam o país de Bolsonaro e “fuga” cresce 35% na última década].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.
Wonderful comments