Larissa Quaresma: Lemann e Buffett? Não copie modelos do passado
Rockefeller ficou rico construindo ferrovias. Jorge Paulo Lemann, vendendo cerveja. Já Warren Buffett fez fortuna comprando ações e as segurando – ou, pelo menos, isso é o que ele diz. Mas dificilmente você ficaria muito rico copiando essas estratégias hoje.
Warren já disse que “nosso período comprado favorito é para sempre”. Mas há um problema com essa frase porque o megainvestidor parece não hesitar em vender empresas quando necessário.
Ele vendeu as companhias aéreas assim que estourou a pandemia. Vendeu uma série de bancos recentemente. Assim, se protegeu dos cenários de restrição de mobilidade e de subida de juros, respectivamente.
Não digo que a frase tenha sido infeliz ou mentirosa. Mas ela não pode ser interpretada isoladamente. Mesmo que eu seja defensora da visão de longo prazo ao investir em ações, acredito que devemos, periodicamente, revisitar nossas escolhas passadas, avaliando se ainda fazem sentido. Se necessário, corrigimos a rota, idealmente mantendo os nomes vencedores e livrando-nos dos perdedores.
Mas um viés pode nos impedir de vender na hora certa: a aversão à perda. Se já caiu muito, hesitamos em vender. Isso acontece porque a perda realizada de um valor nos dói mais do que o prazer de ganhar essa mesma quantia.
Há duas saídas para essa armadilha mental. A primeira vai no sentido de superar o viés de fato, lembrando a si próprio a quantidade de ações que, depois de caírem muito, só fizeram cair mais. Daí, você cria coragem para vender. Aqui vale a máxima: uma ação que caiu 90% é aquela que caiu 80% e, depois, mais 50%.
A segunda saída, caso você realmente queira se manter comprado em determinadas posições, é a montagem de operações vendidas – ou shorts.
Esses trades, que devem ser realizados somente por quem tem um perfil de investidor arrojado, exercem um papel importante na proteção da carteira em mercados de baixa (ou bear markets, para usar o jargão do mercado financeiro).
Temos usado essa tática com frequência na Carteira Empiricus, e é visível o papel que ela exerce em reduzir a volatilidade da carteira como um todo.
Além de idealmente ser um investidor arrojado, recomendo ainda alguns cuidados adicionais na montagem de um short. Na posição comprada (long), sua perda é limitada ao próprio preço da ação. Em um short, a perda pode ser, em tese, infinita: quanto mais a ação subir, mais você perde. Como o preço das ações não tem teto, a perda pode ser ilimitada, caso você erre na aposta. A perícia deve ser redobrada.
O primeiro cuidado adicional, então, é a convicção reforçada no fundamento. Se no long você precisa de uma certa convicção, no short você precisa de, no mínimo, o dobro dessa convicção. Teste seus pontos de vista com muitas pessoas, principalmente com aquelas que discordam de você.
Em segundo lugar, o técnico exerce um papel importante, além do fundamento. A cada dia em que sua operação vendida está montada, você paga uma taxa de aluguel sobre aquela ação.
Não adianta montar um short que vai dar certo em 3 anos. Até esse prazo chegar, você já deixou muito dinheiro com o doador de aluguel daquele papel.
Em vez disso, procure shorts com gatilhos técnicos de curto prazo: um estouro de bolha, uma subida de juros, um resultado horroroso, uma fraude nos números ou uma combinação dos anteriores.
Há dois outros cuidados que gosto de tomar antes de montar um short. Mas, em benefício do tempo do leitor, deixo esses para um outro dia (ou para os assinantes da Carteira Empiricus, que têm acesso à toda a metodologia).
Se preciso deixar uma única mensagem hoje, seria a seguinte: não copie modelos do passado. Dificilmente você será a pessoa mais rica do mundo construindo ferrovias.
Improvável também que se torne o brasileiro mais rico vendendo cerveja. Ou mesmo segurando ações “para sempre”.
Um abraço,
Larissa
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