Felipe Miranda: Renda-se, como eu me rendi
“Eu poderia viver recluso numa casca de noz
e me considerar rei do espaço infinito.”
Hamlet
“A maneira de viver é nos lançarmos não à fé, mas à nossa própria vida, conduzindo-a na afirmação de cada momento, exatamente como ele é, sem querer que nada fosse diferente e sem abrigar ressentimentos mesquinhos contra os outros ou contra nosso destino.”
Sarah Bakewell, em referência a Nietzsche, no livro “No Café Existencialista”
A vida carrega uma angústia constante, dada pela necessidade imperiosa de sempre escolher. Essa angústia lembra a vertigem causada pelo sentimento de estar à beira do precipício. O medo maior não é cair lá embaixo, mas não poder confiar em si a ponto de não se jogar.
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As verdadeiras batalhas são contra a gente mesmo — o universo exterior importa pouco, é como uma casca de noz de finura infinitesimal se comparado à abundância da complexidade interior.
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Na minha opinião — nem eu mesmo acho que ela tem grande valia —, o investidor não desconfia apenas dos bancos, do governo ou de sua corretora. As caricaturas de vilões são fatos estilizados fáceis de vestir, mas os personagens da Marvel estão restritos aos filmes da Marvel. O investidor desconfia também dele mesmo. Esse é um problemão.
O que eu posso fazer para ajudá-lo a investir melhor? Note que é necessário eu acreditar poder ajudá-lo em alguma instância, ainda que pouco — seria uma fissura ética fundar uma empresa de opiniões sobre finanças se considerasse inúteis essas opiniões.
Eu acho, talvez com reconhecida presunção, que posso ajudá-lo a se jogar. E aqui não falo no sentido de um salto de fé, como propõe Soren Kierkegaard — a lista de erros e pecados é grande demais para assumir que há um Deus de braços abertos me esperando para um abraço fraternal.
O pulo aqui proposto é no sentido existencialista, em que você é livre para escolher, para agir e para autoafirmar-se, para, somente depois, formar sua essência como investidor. A existência, também como investidor, precede a essência.
No começo, é um salto no incognoscível, com uma conotação positiva do termo, pois nele há oportunidades e possibilidades gigantescas a serem exploradas, muito bem exploradas. Jogar-se em algo que você não necessariamente conhece a priori, sem que isso signifique abrir mão da segurança, mas expondo-se com responsabilidade a coisas que podem conduzi-lo a bons rendimentos financeiros. Como diria George Soros, “compre primeiro, entenda depois”.
Sob os conselhos do brilhante Felipe Paiva, que não encontra precedentes na impecável condução do processo de democratização e divulgação de bons investimentos à pessoa física junto à B3, não pretendo aqui desconstruir a poupança.
Se ela é importante pra você, ok. Fique com ela — a rigor, na conjuntura atual, ainda que o Tesouro Direto ou o fundo DI do BTG Pactual Digital sejam melhores alternativas (pois oferecem melhor rendimento para o mesmo nível de risco), na ponta do lápis, a diferença pragmática ao final de um ano entre essas coisas é pouco significativa.
O que eu gostaria é que você separasse um pedaço dessa poupança não para uma migração para outra aplicação pós-fixada. Talvez isso lhe soe heterodoxo, pois a maior parte dos analistas e consultores vai dizer para você começar por aí. Cara, na prática, a verdade é que isso mudaria quase nada.
O que eu gostaria mesmo é que você separasse um pedacinho do que está na poupança para aplicações ultra-arriscadas, coisas que pudessem realmente trazer algum impacto material para seus investimentos ao final do processo.
Quanto é esse pouquinho? Não sei. É você quem vai dizer. Falo daquilo que não vai machucá-lo caso seja perdido. O dinheiro da pinga, da marvada, do que não lhe faria diferença caso trouxesse prejuízo. Pode ser 1, 2, 5, 10, 20 por cento da sua grana. Você decide e, então, coloca esse pedacinho do seu portfólio em alguma coisa que pode se multiplicar n vezes, mas que só pode cair 100 por cento.
Se você coloca 95 por cento de seu capital na poupança (ou no fundo DI do BTG Pactual Digital, que é meu preferido, mas, na verdade, meio que tanto faz) e espalha os outros 5 por cento em small caps, opções fora do dinheiro (sempre comprado, nunca vendido), criptomoedas — note que, todas elas, por vezes se tratam de um ambiente absolutamente desconhecido — o que pode lhe acontecer?
Na pior das hipóteses, você vai perder esses 5 por cento, que serão recompensados pelos juros incorridos sobre a aplicação pós-fixada de 95 por cento de seu portfólio, garantindo retornos nominais positivos. Já na melhor, você vai pegar uma multiplicação do tipo Magazine Luiza na sua parte ultra-arriscada. É assimetricamente convidativo, entende? Ainda que você não entenda nada de small caps, opções fora do dinheiro e criptomoedas.
Dizem que a Empiricus é uma empresa arrojada e agressiva. Assim é se assim lhe parece.
Não acho que cabe ao criador definir sua criatura. Respeito cada um dos pontos de vista. Mas será mesmo que os termos acima cabem a nós?
Eu, sinceramente, acho que não. Pra mim, a Empiricus é uma empresa absolutamente conservadora. Pode ser difícil provar o ponto. Melhor assim. E falando em conservadorismo, vamos à origem. “A dificuldade é um instrutor severo, fortalece os medos e apura a nossa capacidade”, como bem definiu Edmund Burke.
O conservadorismo se constitui pela natureza geneticamente antiutópica, conforme sintetiza João Pereira Coutinho. Acredita-se numa imperfeição intelectual humana perante a complexidade e as contingências com que nos confrontamos, e no respeito às tradições úteis e benignas que sobreviveram aos mais variados testes do tempo — nada muito diferente do Lindy Effect tão defendido por Nassim Taleb e, ainda mais marcante, da proposta de Sextus Empiricus.
A realidade jamais poderá ser desenhada por professores sabidões, supostamente (apenas supostamente) capazes de fazê-la caber numa Cama de Procusto ou num modelo econométrico.
Mais uma vez recorrendo a João Pereira Coutinho: “A defesa da imperfeição intelectual humana começa por desautorizar a procura de ideais utópicos, sejam eles revolucionários ou reacionários, porque essas quimeras assentam na arrogância própria de quem se considera onipotente e onisciente, ignorando a sua própria cegueira e as contingências inevitáveis que sempre se abatem sobre a conduta dos homens”.
Ora, não é exatamente isso que os quatro leitores encontram nesta pobre newsletter todos os dias?
Se a argumentação geral não é suficiente, apelo a casos particulares. Alguns exemplos adicionais para tentar mostrar minha discordância com os termos “agressivo” e “arrojado”.
1- Começo por uma questão absolutamente física, material e concreta: nossas instalações. Estamos no prédio, possivelmente, mais seguro de São Paulo. Não se trata de suposta pompa ou tentativa de transmitir um recado arrogante de que “chegamos lá” — se quer saber, eu mesmo fui contra a mudança justamente para tentar evitar esse mimimi.
Ao final, pesaram mais a vontade de oferecer a nossos colaboradores um ambiente de trabalho confortável e frutífero, e de poder receber amigos, convidados e parceiros num lugar bacana.
2 & Do ponto de vista empresarial, dificilmente entramos em projetos consumidores de caixa — se o fazemos, há um limite claro para stop loss. “Fail fast, fail small” (falhe rápido, falhe pequeno). Temos muito claro o conceito de perda irrecuperável. Não importa o quanto já gastamos em algo; se implicar mais perdas à frente, o projeto é interrompido imediatamente.
Leve o conceito para gestão dos investimentos. Não importa o preço que você pagou numa ação. A ideia de “manter” não existe. Se não vai subir na frente, venda. O preço de entrada é irrelevante. Se caiu ou subiu, nada muda. A única questão relevante é: o que vai acontecer daqui pra frente? O passado não se muda.
3 & Sob a ótica da gestão financeira e da estrutura de capital, o Rodolfo é uma espécie de pitbull com esteroides sentado sobre o caixa. O controle do orçamento é feito em base diária, a empresa é uma sólida geradora de caixa e não há um real de dívida — nem nunca houve, nem haverá (a não ser, claro, que sejamos pegos por um cisne negro no meio do caminho).
4 & Todas as nossas sugestões de investimento baseiam-se no princípio da diversificação, da não alavancagem e das proteções. Ah, mas a diversificação não é a arma daqueles que não sabem o que estão fazendo? Justamente! Normalmente, nós não sabemos mesmo.
Retomamos na veia a ideia essencial do conservadorismo, de sermos adeptos da imperfeição intelectual humana e de jamais acreditarmos que seremos capazes de antever o futuro, que insiste em continuar… no futuro! Por isso, somos muito mais diversificados do que a média do mercado (a diversificação é o último almoço grátis disponível) e insistimos na necessária presença de proteções em qualquer portfólio.
Não é uma ideia platônica. É uma prática concreta. Cheque com seus próprios olhos na Carteira Empiricus. Rigorosamente a mesma filosofia foi preservada no Vitreo FoF SuperPrevidência (corra porque ele está perto de fechar por conta de restrições de capacity) e no Vitreo FoF Melhores Fundos — de algum modo, participamos da concepção original desses produtos, para depois terem um segundo carimbo a partir da diligência da própria Vitreo.
5 & “Ah, mas e as campanhas de marketing?” Chegamos aonde queriam, né? Das características do conservadorismo, talvez a mais marcante seja a obstinação por preservar instituições (formais ou informais) e tradições que resistiram ao teste do tempo, que, de uma forma ou de outra, estão funcionando, comparativamente a investir em uma ideia nova não testada, derivada de alguma proposta platônica e utópica que parece uma quimera apenas na cabeça do revolucionário.
Entre o tradicional que funciona e uma nova possibilidade não verificada empiricamente, ficamos com o primeiro. Somos a Empiricus, certo? Tudo que fazemos aqui é rigorosamente copiar a estratégia de nossos sócios norte-americanos, os maiores publishers do mundo de conteúdo financeiro.
“Ora, mas o mercado americano é muito maduro e mais liberal.” Bom, na verdade, o modelo está presente em mais de 20 países, das mais variadas matizes, incluindo França, Alemanha, Argentina, China e Índia.
Entre o existencialismo de Sartre e o conservadorismo de Burke, podemos encerrar com Clarice Lispector: “Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento”.
P.S.: Da série “atualizações de indicações históricas”: como um entusiasta da gestão passiva dos investimentos, sem que isso signifique não haver espaço para gestão ativa (as coisas são complementares, não necessariamente concorrentes), apontei aqui num passado distante a alternativa de se comprar BOVA11 para capturar o bull market estrutural que entendo estar em curso no Brasil desde janeiro de 2016.
Num segundo momento, troquei essa sugestão para BOVV11, que basicamente faz a mesma coisa (ambos replicam a carteira teórica do Ibovespa), mas cobra uma taxa de administração menor e aluga mais papéis do portfólio, o que acaba se traduzindo em retornos líquidos maiores para o investidor no final.
Preciso voltar ao tema, pois agora uma das melhores alternativas para esse objetivo está no BTG Pactual Ibovespa Indexado FIA, disponível para mínimos de 500 reais, cuja taxa de administração é de apenas 0,15 por cento ao ano.
Em tempos de Selic a 6,5 por cento ao ano e com prognóstico de queda, raspas e restos me interessam. Antes de sair fazendo stock picking, compre um bocado disso. É bem mais simples, fácil, menos arriscado. Um excelente começo para um conservador.
O que você está lendo é [Felipe Miranda: Renda-se, como eu me rendi].Se você quiser saber mais detalhes, leia outros artigos deste site.
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